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Foto do escritorCláudio Giordano

O Folclore do Vinho

Em 1980 José Roberto Whitaker Penteado publicou o livro O Folclore do Vinho, hoje esgotado e aparentemente não reeditado. De leitura agradável, depois de enaltecer a bebida dionisíaca -- “mais do que bebida, é filosofia, forma de conceber a vida e de compreender o homem” — declara ter sido natural “apaixonar-se pelo folclore do vinho”, e mesmo sendo neófito na matéria, iniciou “uma pesquisa livresca na Biblioteca Municipal de São Paulo, que continuou na Biblioteca Imperial de Petrópolis, na Biblioteca do Office Internationale de la Vigne e du Vin e em outras bibliotecas públicas e especializadas de várias cidades da Europa. O resultado são quase 400 saborosas páginas discorrendo de forma amena sobre provérbios, quadrinhas, trovas, autos, desafios e mais coisas encontradas no folclore brasileiro e de dezenas de outros países. Não é obra de erudição, mas as fontes de referências garantem a exatidão das informações.



Colhendo referências vinárias nas obras dos viajantes, escreve Whitaker Penteado a respeito do inglês John Luccock:


“Luccock deve ter gostado muito do Brasil, pois aí viveu dez anos, entre 1808 e 1818. Seu livro [Notas sobre o Rio de Janeiro e Partes Meridionais do Brasil, 1820] é um monumento de sense of humour, temperado com admirável fair play. O vinho é personagem de certo relevo. pois o inglês considerava-se homem de boas maneiras, gostos refinados e bom copo.


Deve-se a Luccock uma original caricatura dos costumes da sociedade carioca, da arte de servir e comportar-se à mesa. Convidado para um jantar no Rio de Janeiro logo após sua chegada, relatou em termos de reportagem a inesquecível experiência:



Os pratos são trazidos um por um, serve-se uma porção a cada qual, sucessivamente, e ninguém recusa nem principia a comer antes de o último estar servido; põem-se, então, todos juntos a devorar vorazmente o conteúdo dos pratos. Comem muito e com grande avidez, e apesar de embebidos em sua tarefa, ainda acham tempo para fazer grande bulha. A altura da mesa faz com que o prato chegue ao nível do queixo; cada qual espalha seus cotovelos ao redor e, colocando o pulso junto à beirada do prato, faz com que, por meio de um pequeno movimento hábil, o conteúdo todo se lhe despeje na boca. Por outros motivos, além deste, não há grande limpeza, nem boas maneiras, durante a refeição; os pratos não são trocados (para reenchê-los), sendo entregues ao copeiro, segurando-se o garfo e a faca numa mesma mão; por outro lado, os dedos são usados com tanta frequência quanto o próprio garfo. Considera-se como prova de incontestável amizade comer no prato do vizinho e, assim, não é raro que os dedos de ambos se vejam, simultaneamente, mergulhados num só prato. Usa-se de uma espécie de vinho tinto fraco, mas como este é bebido aos copos, seus efeitos, por vezes, se tornam fortes. Antes do final da refeição, todos ficam barulhentos, exagera-se a gesticulação, de que mesmo normalmente usam em suas conversas e desfecham punhadas no ar, de faca ou garfo, de tal maneira que um estrangeiro pasma que olhos, narizes e punhos escapem ilesos. Quando facas e garfos estão em repouso, fica cada um numa das mãos, em posição vertical, e quando deles não mais necessitam, limpam-nos ostensivamente na toalha da mesa. Ficam à mesa cerca de duas horas. Os brasileiros não economizam vinho, tomando-o a todo instante. Bebe-se uma quantidade mais do que razoável com a comida, e as garrafas se vão, uma a uma, esvaziando.


Em matéria de vinhos, o inglês continua o seu duro aprendizado brasileiro e registra sem perder a fleuma:


Quando um cavalheiro toma vinho em companhia doutro, o grau de consideração que reciprocamente alimentam se mede pelos seus copos cheios até os bordos, e tudo fazem para levá-los até os lábios sem derrubar uma gota; o vinho é engolido num gole só e, tanto quanto possível, os dois terminam ao mesmo tempo. Quando o dono da casa propõe uma saúde, em geral dedica-a a sua esposa e, a fim de bem homenageá-la, já vi, de uma feita, engolir-se de uma vez uma garrafa inteira sem tomar fôlego.


Voltaremos a falar desta obra de Whitaker Penteado.





 




El Folclore del Vino



En 1980 José Roberto Whitaker Penteado publicó el libro O Folclore do Vinho, ahora agotado y aparentemente no reeditado. Lectura amena, después de ensalzar la bebida dionisíaca — “más que una bebida, es filosofía, una forma de concebir la vida y comprender al hombre” — declara que era natural “enamorarse del folclore del vino”, e incluso siendo un neófito en el campo, inició “una investigación de libros en la Biblioteca Municipal de São Paulo, que continuó en la Biblioteca Imperial de Petrópolis, en la Biblioteca de la Office Internationale de la Vigne et du Vin y y en otras bibliotecas públicas y especializadas de varias ciudades de Europa.


El resultado son unas sabrosas casi 400 páginas que hablan de manera amena sobre refranes, cómics, piezas, actos, desafíos y más cosas que se encuentran en el folclore brasileño y en decenas de otros países. No es un trabajo de erudición, pero las fuentes de referencia garantizan la veracidad de la información.


Whitaker Penteado, que recoge referencias al vino en las obras de los viajeros, escribe sobre el inglés John Luccock: “A Luccock le debe haber gustado mucho Brasil, ya que vivió allí durante diez años, entre 1808 y 1818. Su libro [Notas sobre o Rio de Janeiro e Partes Meridionais do Brasil, 1820] es un monumento de sense of humour, aderezado con admirable fair play. El vino es un personaje de cierta importancia, ya que el inglés se consideraba un hombre de buenos modales, gustos refinados y una buena copa.


Luccock es responsable de una caricatura original de las costumbres de la sociedad carioca, del arte de servir y comportarse en la mesa. Invitado a una cena en Río de Janeiro poco después de su llegada, registró en términos de informe la experiencia inolvidable:


Los platos se traen uno a uno, se sirve una ración a cada uno por turno, y nadie se niega ni empieza a comer antes de que se sirva el último; luego se van todos juntos a devorar vorazmente el contenido de los platos. Comen mucho y con mucha avidez, y a pesar de estar empapados en su tarea, todavía encuentran tiempo para hacer un gran escándalo. La altura de la mesa hace que el plato llegue al nivel de la barbilla; cada uno extiende los codos y, colocando su muñeca al lado del borde del plato, con un pequeño movimiento hábil, hace que todo el contenido se vierta en su boca. Por esto y otras razones, no hay gran limpieza ni buenos modales durante la comida; los platos no se cambian (para rellenarlos), se entregan al mayordomo, sosteniendose el cuchillo y el tenedor en la misma mano; por otro lado, los dedos se usan con tanta frecuencia como el tenedor mismo. Se considera prueba de indiscutible amistad comer del plato del vecino y, por ello, no es raro que los dedos de ambos se encuentren sumergidos simultáneamente en un solo plato.


Utilizan una especie de vino tinto débil, pero como se bebe por copa, sus efectos a veces se vuelven fuertes. Antes del final de la comida, todo el mundo se pone ruidoso y exageran en los gestos, que incluso suelen utilizar normalmente en sus conversaciones; apuñalan el aire con cuchillo o tenedor, de tal manera que un extranjero se asombra de que ojos, narices y puños escapen ilesos. Cuando los cuchillos y tenedores están en reposo, cada uno está en una mano, en posición vertical, y cuando ya no se necesitan, los limpian ostentosamente sobre el mantel.


Permanecen en la mesa unas dos horas. Los brasileños no escatiman en vino, lo beben todo el tiempo. Se bebe una cantidad más que razonable con la comida, y las botellas se van vaciando, una a una.


Respecto a los vinos, el inglés continúa su duro aprendizaje brasileño y escribe sin perder la flema:


Cuando un caballero bebe vino en compañía de otro, el grado de consideración que tienen el uno por el otro se mide por sus copas llenas hasta el borde, y hacen todo lo posible para llevárselo a los labios sin derramar una gota; el vino se bebe de un trago y, en la medida de lo posible, los dos terminan al mismo tiempo. Cuando el dueño de la casa propone una buena salud, generalmente se la dedica a su esposa y, para honrarla bien, he visto, en una ocasión, tragarse una botella entera de una vez sin respirar.


Volveremos a este trabajo de Whitaker Penteado.




 



The Folklore of Wine



In 1980 José Roberto Whitaker Penteado published the book O Folclore do Vinho, now out of print and apparently not reissued. A pleasant reading, after extolling the Dionysian drink — “more than a drink, it is philosophy, a way of conceiving life and understanding man” — he declares that it was natural to “fall in love with the folklore of wine”, and even being a neophyte in the field, he began “a book research in the Municipal Library of São Paulo, which continued in the Imperial Library of Petrópolis, in the Library of the Office Internationale de la Vigne et du Vin and in other public and specialized libraries in several cities in Europe. The result is almost 400 tasty pages talking in a pleasant way about proverbs, comic strips, ballads, autos, challenges and more things found in Brazilian folklore and in dozens of other countries. It is not a work of scholarship, but reference sources guarantee the accuracy of the information.


Collecting wine references in the travellers’ works, Whitaker Penteado writes about the Englishman John Luccock: “Luccock must have liked Brazil very much, as he lived there for ten years, between 1808 and 1818. His book [Notes on Rio de Janeiro and Southern Parts of Brazil, 1820] is a monument of sense of humour, seasoned with admirable fair play. Wine is a character of certain importance, as the English considered himself a man of good manners, refined tastes and a good glass.


Luccock is responsible for an original caricature of the customs of Rio society, the art of serving and behaving at table. Invited to a dinner in Rio de Janeiro shortly after his arrival, he wrote in terms of reporting the unforgettable experience:


The dishes are brought in one by one, and a portion of each is handed to every person in succession, none refusing, or beginning to eat before the last is served; then all begin together, and voraciously devour the contents of their plates.


They eat much, as well as greedily; and though intent upon their business, find time to be very noisy. The height of the table brings the plate near to the chin; every one spreads out his elbows, and bringing his wrist close to the edge of the plate, tosses the food into his mouth by a dexterous motion of the hand. On other accounts as well as this, there is not much delicacy or cleanliness in the meal; plates are never changed, and are delivered to the servants with the knife and fork held in the same hand; the fingers, too, are as often used as the fork. It is accounted a mark of strong attachment for a man to eat off his neighbour’s plate; so that the hands of both are not unfrequently dipped into it at the same time. A weak sort of red wine is used, but, being drunk from tumblers, it sometimes operates powerfully; before the conclusion of the repast, the company become boisterous, their common gesticulation in talking is increased, and they throw their arms about, with their knives and forks, in such a way that a stranger feels no little surprize, how eyes, noses, and cheeks, escape from injury. When the knives and forks are at rest, one is grasped in either hand, and held upright on the table, resting on the end of its haft; and when they are no longer wanted the knife is deliberately wiped upon the cloth. The business of the table lasts about two hours. Brazilians do not sit at their wine; a sufficient quantity is taken with the food, and the compliments of the bottle are carried to a great extent.”


In terms of wines, English continues its hard Brazilian learning and registers without losing its phlegm:


When a gentleman takes wine with another, the degree of their regard is expressed by the fulness of their tumblers, and both endeavour to carry them to their lips without spilling a drop; the wine is drunk off at a single draught, and as exactly as possible in the same time. If the master of a house propose a toast, it is generally the health of his own wife; and to honour the lady I have seen a whole bottle swallowed without a pause.


We will return to this work by Whitaker Penteado.




 

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